Escrito por Luiz Flávio Gomes. Publicado em 3 de dezembro de 2015
Como tramita o impeachment?
Um dos máximos escroques da corrupção no país, Eduardo Cunha, anunciou que deferiu a tramitação de um dos pedidos de impeachment
de Dilma. A lei 1.079/50 (que regulamenta o assunto) prevê 65 infrações
administrativas contra o(a) Presidente(a). É ela que deve ser seguida
rigorosamente (conforme decisão recente do STF).
O parecer de Eduardo Cunha (que ele diz
ser “técnico”) deve ser publicado no Diário Oficial. Em seguida, deve
ser lido no Plenário da Câmara dos Deputados. Ele não tem poder para
decidir sobre a abertura ou não do processo de impeachment. Isso compete a uma Comissão Especial.
Logo após essa leitura é preciso então
constituir uma Comissão Especial formada por deputados federais,
respeitando-se a proporcionalidade do tamanho das bancadas na Casa. Essa
Comissão decidirá sobre a pertinência ou impertinência do pedido. Se
impertinente ele é arquivado de plano. Se pertinente, começa o direito
de defesa.
Colhidas as provas e exercido o direito
de defesa plena, compete a essa Comissão emitir um parecer (pela
procedência ou improcedência do pedido).
Esse parecer final da Comissão será
votado pelo Plenário. A aprovação da acusação formal contra a
Presidente(a) necessita de 342 votos (2/3 da Casa) para ser aprovada.
Havendo deliberação positiva, automaticamente a Presidente(a) fica
afastada das suas funções, por 180 dias.
A acusação formal será enviada ao Senado, a quem compete, sob a presidência do Presidente do STF, a decisão final do impeachment. Também no Senado são necessários os votos de 2/3 (54 senadores) para a condenação.
As penas que podem ser impostas são a de
perda do mandato e inabilitação política por 8 anos. Nesse caso assume o
governo o vice-presidente, para cumprir o restante do mandato. Não há
que se falar, nessa situação, em novas eleições gerais.
Se o vice-presidente também ficar
impedido para o exercício da presidência aí temos o seguinte: (a) se
isso ocorrer nos 2 primeiros anos do mandato, teremos novas eleições
gerais diretas; (b) se isso ocorrer nos últimos 2 anos, cabe ao
Congresso escolher o novo Presidente da República. O presidente da
Câmara assume interinamente para promover essa eleição “tampão”.
O presidente da República jamais pode
ser preso enquanto não for condenado criminalmente pelo STF em sentença
com trânsito em julgado. Por crimes estranhos a suas funções, o
presidente não pode responder durante o mandato.
Por qual motivo Cunha admitiu a tramitação do impeachment?
O presidente da Câmara “disse que,
apesar de haver dúvidas sobre esse ponto entre juristas, ele manteve o
entendimento de que não seria possível abrir um processo de impeachment
com base em fatos do primeiro mandato da presidente (2011-2014)”.
Sua decisão foi então baseada “nos
decretos presidenciais deste ano que autorizaram um aumento de gastos do
governo apesar de já haver a previsão de que a meta de superávit
(economia para pagar juros da dívida) poderia não ser atingida”. São as
famosas “pedaladas fiscais”.
Nenhum outro motivo, neste processo,
pode mais ser discutido. A polêmica jurídica vai girar em torno desse
pedido (desse ponto). Qualquer outro motivo para o impeachment deve ser objeto de outros pedidos.
Ao mesmo tempo em que Cunha anunciava a tramitação do impeachment,
o Congresso Nacional aprovava o projeto de lei que autoriza o governo a
fechar o ano com déficit no Orçamento. Com base nessa nova lei é
possível que o PT vá ao STF para aniquilar a tramitação do impeachment
no seu nascedouro. Leia-se: o governo Dilma, agora, está autorizado a
fechar o ano com déficit. O excesso de gastos do governo virou “déficit
autorizado” pelo Congresso. Lei favorável, retroage. Eventuais
irregularidades nos gastos podem ter sido “anistiadas” (do ponto de
vista da responsabilidade fiscal). A polêmica jurídica está apenas
começando.
Pelas razões que acabam de ser
ventiladas, não há como deixar de concluir que, do ponto de vista
jurídico, o fundamento do pedido de impeachment é discutível
(eu particularmente lamento muito, porque gostaria de ver o governo do
PT fora do poder). O ideal seria que houvesse um fundamento jurídico com
indiscutível consistência e, ademais, que a tramitação não tivesse sido
autorizada por um dos maiores mentirosos e corruptos da República
Velhaca (1985-2015).
Do ponto de vista político pode ser que
aconteçam manifestações populares. Precisam ser robustas para levar a
Presidente(a) à renúncia (algo que o povo da Guatemala conseguiu faz
pouco tempo em relação ao seu presidente acusado de corrupção).
Necessidade de uma faxina geral
O Brasil, no quarto governo lulopetista,
virou um caos. Está à beira de um colapso, que é a antessala do abismo.
O baixíssimo índice de popularidade de Dilma e a situação econômica do
País sinalizam que temos que nos livrar desse governo o quanto antes,
mas não estou conseguindo ver, com o PMDB no poder, luz no fim do túnel.
Ele (com Cunha, Lobão, Renan etc.) faz páreo duro ao lulopetismo em
termos de desavergonhada corrupção. Tampouco os atuais partidos de
oposição (PSDB, DEM etc.) possuem um plano sustentável de governo.
Os políticos “mafiosamente
profissionais” da República Velhaca (1985-2015) não nos passam
confiança. A crise econômica tende a atingir seu ápice em 2016. Sem uma
faxina geral na escória governante e dominante (política, empresarial,
bancária e administrativa), o Brasil nunca será passado a limpo
(correndo o risco de ser um país do futuro daqui a 50 anos). Nós,
brasileiros, somos também responsáveis pela nação. Não podemos ficar
inertes. Precisamos descobrir o que há de novo em alguns pouquíssimos
políticos antigos (faxinando o restante) e tomar muito cuidado com o que
há de antigo inclusive em políticos novos.
Fonte: http://luizflaviogomes.com/impeachment-da-dilma-qual-a-chance-juridica-de-prosperar/
Sobre o autor
Luiz Flávio Gomes é professor e jurista, Doutor em
Direito pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito
Penal pela USP. Exerce o cargo de Diretor-presidente do Instituto Avante
Brasil. Atuou nas funções de Delegado, Promotor de Justiça, Juiz de
Direito e Advogado. Atualmente, dedica-se a ministrar palestras e aulas e
a escrever livros e artigos sobre temas relevantes e atuais do
cotidiano.